Friday

*Izzard is dressed to kill

Por acaso, eu vi na HBO esse comediante vestido como um travesti chinês. Alto, cabelos curtos e loiros, rosto muito maquiado, unhas pintadas de cor escura, sandália de plataforma. Lembrei dele ganhando algum prêmio: acho que foi o Emmy Awards. O show era Dress to Kill e o travesti, o comediante inglês Eddie Izzard. Por quase duas horas ininterruptas, ri escandalosamente e com gosto, durante a performance de stand up dessa interessante figura.

"I'm an Action Transvestite
"

Eu nunca tinha visto um show de comédia tão longo. Normalmente esses stand ups duram 20, 30 minutos. Mas Eddie Izzard fez um show longo e com encore! Ridicularizou a história, os americanos e os franceses. How British ! :-)

"If you've never seen an elephant ski
then you've never been on acid!"


Depois fui ver que ele já esteve em alguns filmes, como Velvet Goldmine (como o manager do astro glitter que finge estar morto), em Mistery Man (um filme versão dos quadrinhos que não emplacou), Shadow of the Vampire (onde John Malkovich faz F.W.Murnau e Willen Dafoe faz o ator de Nosferatus, que se revela não estar brincando em serviço). E para o próximo ano, Izzard estará nos cinemas em Cat's Meaw, revivendo ninguém menos que Charlie Chaplin.

"I wanna live 'til I die,
no more, no less."


Wednesday

*Esperando pelas 4:20h

Não para de ventar aqui em Davis... Uma ventania louca!

No sabadão, eu vesti a fantasia da Carmen Miranda e tomei duas Tequizas em homenagem à minha amiga aniversariante. Cheers!! Ouvi o burburinho que me pareceu uma concorrida noite de autógrafos e fui preparar a pizza na minha casa em silêncio. Misty Gray me acompanhava, pra lá e pra cá. Minha cunhada telefonou e conversamos e gargalhamos por mais de uma hora. Meu telefone apita 'piipiii', porque eu falo tanto que a máquina avisa que a bateria está acabando. Preciso ligar pra ele: 'trriiiintriiiin.... oi, você não vem jantar? a pizza tá pronta.'. Ele vem, jantamos juntos - cerveja e pizza, sorvete de sobremesa no sofá da sala, vendo o filme da Maryl Streep - Music From The Heart. De mãos dadas, mão macia no pescoço, mão amiga no ombro, uma felicidade tão grande nas nossas caras e corações. Pra variar eu choro, choro com as crianças tocando violino. Ele pergunta se não quero mais uma cervejinha, 'quer ficar altinha?'.

Entre cochilos e risadas, conseguimos ver o Saturday Night Live. Jacob Dylan lançou trabalho novo com o Wallflowers. Ele tenta, tenta, mas os genes são mais fortes. Como ele parece, mesmo sem querer, com o pai... Dana Carvey faz o ex-presidente Bush em dois sketches... Os candidatos à Presidência - G.W. Bush e A. Gore são representados como umretardado e um bolha, respectivamente. É pra rolar de rir! Por que os políticos são material tão rico pra comédia? Existe alguém que leva essa gente à sério?? Eu não estou acompanhando os debates. No terceiro 'round', estava colocando e amarrando meu tênis na escada, quando vi algumas cenas (parecia um teatro) e ouvi algumas declarações (meudeus, ainda bem que eu não voto neste país. me desobriga de me sentir responsável por tudo isso..). Os dois candidatos são a favor da pena de morte. Lord have mercy! E a discussão que ouvi era como eles vão gastar o surplus de 3 trilhões! Um superavite de TRES TRILHÕES! O Bush quer devolver esse dinheiro para o povo que paga taxas. Epa, aqui eu me incluo! Também quero! Cuidar dos velhos ou das crianças? O que é mais importante, o bem estar de quem já deu o suor do rosto pelo país ou a educação das crianças que trarão o futuro? Sei la....

Só sei que inauguraram um Starbucks dentro do supermercado onde eu faço minhas comprinhas semanais. Eles estão com um baita problema de greve dos distribuidores. Eu vi na tv os grevistas fazendo protesto na frente das lojas. O Safeway nem piscou, simplesmente botou substitutos pra fazer o trabalho dos grevistas e estão dividindo a opinião pública. Tem gente que parou de comprar lá, até a situação se regularizar. Podem me chamar de alienada, mas eu nem notei nada disso. Não tinha piquete aqui em Davis, então a única coisa que reparei foi que instalaram um porta-copos em todos os carrinhos da loja, pra você poder colocar seu café, ou chá gelado, ou qualquer bebida que comprar no novo Starbucks e poder degustá-la sem ter perigo de deixar cair, ficar sem ter como empurrar o carrinho ou coisas mundanas do genêro. O que importa é o seu prazer, sua segurança, a facilidade, a gentileza
do pessoal e os preços baixos. O resto? ah... who cares?

Amanhã meu pai faz 70 anos. Eu liguei pra ele hoje, porque sabia que a comemoração seria adiantada. Também comemoraram o aniversário do pai do Fausto e os 40 anos de casamento do meu pai e minha mãe. O Gabriel falou primeiro. Eu sei que bater papo com o neto é o maior presente pra eles. Eu converso com os dois, primeiro minha mãe e depois meu pai, que diz que está super bem, saúde boa, só uns dias de mau humor (minha herança genética!), bem ativo, bem disposto, só que agora, entrando nos setenta, vai começar a fazer exames de colesterol e outras coisinhas mais frequentes, mas isso é só praxe, porque ele nem fica doente, é uma gripe ou duas por ano. E eu desligo o telefone e agradeço à Deus! Eu sou como a Angelina Gattai, mãe da Zélia: não gosto de ficar pedindo coisas, mas acho fundamental agradecer! E não tem como agradecer suficientemente o fato de termos saúde. Obrigada! Obrigada! Murmurei contente, enquanto colocava o arroz no fogão para nosso pequeno almoço de domingo em família. Hoje tivemos o Gabriel na mesa. Agradeci de novo! Ele me pergunta como que traduz 'bored'. Como traduz estar assim meio de saco cheio, sem fazer nada? Eu respondo que é 'entediado'. A Marianne deve estar ocupada... O Gabriel está entediado. E eu ocupo o meu tempo, esperando para irmos ao cinema, escrevendo compulsivamente.... Que boring! Que tédio! Coisa de domingão..... Amanhã isso passa!
*Smart Cookies

Joan - 5 anos

- Fernanda...
- Sim, Joan?
- Você sabe, minha mãe disse que eu sou 'especial'.
- É mesmo? Por que?
- Ela disse que eu sou especial porque eu sou uma ABC.
- ABC??
- Sim, ABC - American Born Chinese... Eu sou especial porque eu sou ABC e porque eu falo duas línguas!
- Ah, sei... entao eu também sou especial, porque eu falo TRÊS línguas...
- (cara de surpresa) Três???
- Sim! Três e sabe o quê? Todas as mães dizem que seus filhos são especiais. E são especiais mesmo, porque todo mundo é especial de alguma maneira.


Julie - 4 anos

- Fernanda...
- Sim, Julie?
- Fernanda, o Brian disse que eu sou a 'mãe', mas eu
não quero ser a mãe...
- Como assim, Julie? Por que você tem que ser a mãe?
- Porque ele disse que eu sou a mãe, mas eu não quero ser a mãe.
- Então vai lá e diz pra ele que voce não quer ser a mãe...
- Okay, eu vou dizer.
- E diz o que você quer ser. O que você quer ser, Julie?
- Eu quero ser uma 'pessoa'.


Luana - 5 anos

- Fernanda...
- Sim, Luana?
- Como que você entende quando eu falo em português?
- Ah, é porque eu sou brasileira!
- Mas você não tá lá no Brasil.
- Mas eu nasci lá, como você.
- Mas você mora em Davis...
- Sim, eu moro, mas minha mãe e meu pai estão no Brasil, lá pertinho da sua vovó e seu vovô.
- Em São Paulo?
- Sim, bem pertindo de São Paulo.
- Ah, tá!

Tuesday

*Perdidos no Espaço

"Ground control to Major Tom…
Can you hear me Major Tom?
Can you hear me Major Tom…?"

                (Bowie - Space Oddity)


Tô  cansada de lavar e cozinhar tomates. Tinha uns 30 quilos do 'fruto vermelho'  na minha pia. Em etapas, espaçadas num período de 24 horas, eu  lavei,  cozinhei,  penerei,  engrossei e congelei tanto tomate que minha cozinha ficou com cara de cena de assassinato e esquartejamento. O  purê  escorrendo  na beira da panela de pressão Panex de 4,5 litros secou  e  ficou  com  cara  de  sangue coagulado. Quando eu pensei que estava  acabada  com  a  função, hoje vejo mais dois sacões de tomates vermelhos, brilhantes, com cheiro de plasma, no chão da minha cozinha.

No  dia  do  aniversário  de  40  anos  dele  recebemos  a  carta  que esperávamos  há  seis  meses.  Mas  não foi um presente alegre. Foi um presente  de  qualquer  maneira, porque tirou o peso da ansiedade e da frustração  diária  de  abrir a caixa do correio e não encontrar nada. Mas  as  palavras  do  INS  nos  chocou.  A princípio nem entendemos a linguagem legal e o vocabulário burocrático. O advogado - bendita raça - traduziu tudo para palavras leigas e então paralisamos com o absurdo surreal  que estávamos vivendo. Muitos disseram que é assim mesmo, que a imigração americana é treinada para ser insuportávelmente pentelha e pegar  nos micros detalhes de cada mínima coisinha. E vocês pensam que é  fácil?  Que  é  só ir chegando e se instalando? Vimos a nuvem negra passar  sobre  nossas  cabeças  como  num  filme acelerado e sem poder falar,  somente  nos  olhando, os laços de companheirismo e de amor se estreitando, trocando palavras de entendimento, buscando soluções.

Recebi  o  empurrão  que  eu  precisava  para  me  mover. Eu cheguei à conclusão que eu só ando pra frente na base da sopetada. Todos os dias eu  ia  trabalhar  sem  aquele  tesão que eu tinha antes, de curtir as crianças,  me  envolver  com  os  problemas  e  até vestir a camisa do montessorianismo.  A  perda de interesse nesse meu emprego poderia ser explicada  pela ausência de recompensa monetária nos últimos meses. Os cheques  quinzenais  sempre  foram  muito importante pra mim. Não só o dinheiro,  mas  a sensação da independência e da auto-suficiência. Mas aos  poucos  tudo  foi  escorrendo,  desbotando,  perdendo  o  brilho, tornando-se  pesado  e  sacrificante.  Mas  finalmente  o  presente da imigração  me  empurrou  pra  frente,  pra  única atitude viável nessa situação  já  suficientemente  confusa.  Então mais três dias e eu não terei  mais  crianças  pra  contar  estórias,  pra  rir junto, pra dar bronca,  pra  ouvir frases inteligentes, pra ganhar abraços, pra ouvir "you  are  so pretty, Fernanda..", "I like your hair!", "Where did you buy those beautiful bracelets?", "I missed you!", "Can you please help me?"....

E  eu  não consigo chorar. Dancei por quase uma hora, rodopiando com a Stevie  Nicks,  Marcy  Gray  e  Sting  (já  falei  que  sou  altamente influenciável??)  pelo espaço flutuante do meu quarto de jirau ( o tal do  loft)  nas  alturas. Dancei suando e piruetanto, soltando o corpo, com  movimentos  simbólicos  de  liberdade,  de  quem teve os braços e pernas,  já  então  bem  amarrados,  mais  apertados como se fazem com prisioneiros que estavam quase conseguindo escapar. Solitária pra ela! Quantos meses serão de ostracismo? Vou deixar crescer os cabelos até a cintura,  virar  uma  ermitã,  escrever  e  me  comunicar daqui do meu pequeno  mundo.  Alguém  vai  me  ler  e  comentar  "você conhece essa Fernanda  Guimarães  Rosa?". Vão dizer que não, mas que parece que ela realmente existe, que vive isolada num jirau, que tem até uma homepage com fotos (serão elas falsas?) e que algumas pessoas de umas listas de discussão na internet juram de pés juntos que a conheceram, em carne e osso  (mais osso que carne)e que ela não é um mito urbano, como muitas correntes de sorte na internet parecem fazer crer.